junho 25, 2006

Sufocar

foto: Nuno Agosto

É nas lágrimas que permaneço
É na chuva desse odor
Curvo-me solene ao reencontro
Busco-me
É nas lágrimas que reencontro
É na chuva dessa dor
Ergo-me desgrenhada em fusão
Encontro-te:
respiração ausente
olhar orbitalmente ausente
frio, calor intermitentemente
presentes no ausente
de te ter presente: AQUI!!!!

junho 22, 2006

Em Farol - o fim

O farol... como não pensei nisso antes, um momento que fosse... antes... Procurarias o nosso refúgio, o farol... Um turbilhão de cores e flashes fulminantes a pregarem-se-me à cabeça como um vómito sandio a aniquilar toda a beleza triangular a esvair-se pelas minhas mãos, regredir, a regredir, em espiral, volteando um subúrbio pulmonar de coração pungente a abraçar-me o peito num sufoco... em espiral. Corri para te alcançar... corri... corri, tropecei no empregado de mesa, pisei algumas das senhoras primorosas e corri à varanda, à varanda, ao fundo o mar... o mar... a música heraldicamente marroquina a saltar-me pelos olhos... vi ao fundo uma sombra branca, branca tão branca como a tua mão que segurei de seguida... quis dizer-te o quanto amei a nossa vida utópica!.. o quanto... estavas pálida muito pálida, pareceu-me que sorriste enquanto te arrancava do lençol púrpura de rosas negras, sem espinhos, polinizadas a orquídeas brancas... o teu pulso... o teu pulso... creio que o senti… juro que o senti ainda ou seria um reflexo da agulha ancorada à tua veia... ou da líquida morfina a sugar-te a respiração e condensando, congelando, os teus lábios de gueixa pura... tão pura... e fiquei ali a ver as gaivotas, a sentir o vento, a ouvir de fundo aquela música estranhamente familiar... as ondas... as ondas... a ouvir... a festa continuou e, no dia seguinte, propagou-se, alastrando-se colorida no teu funeral... irónica... mesmo depois de todo o sal sugado das entranhas de todos a quem tanto querias simplesmente bem... sendo irónica... ironicamente irónica...
Beijo... simplesmente e tão simplesmente beijo... em... a.... em.... ... ... ti....

junho 18, 2006

Escreve-te...

foto: Angélica

Não me olhes mais os lábios
Não te sentes mais nos meus olhos
Ergue-te e acolhe a minha pele
Ergue-te e submerge-te nos meus cabelos
Não sorrias isoladamente
Não caminhes isoladamente
Vem nessa nuvem bem devagarinho
Vem e caminha com teus dedos
o suor da tua face
o rubor de teu peito
tictacteando nas linhas de meu corpo
eriçando-me in utero ao demais na luz
no semblante desse toque
Roça-me
Emerge-me
Rasga em mim as letras desse poema
como se me vincasses o solarengo amanhecer
na epiderme em que me visto
Escreve-me...
Arranca em mim o gemer dessa tinta
como se me matasses na fúria desse acontecer
a sede de me teres escrito...
deixa em mim a tua escrita...

junho 13, 2006

Em Farol - Parte III (cont.)

Tinha o desenho de um tigre a saltar, um salto violeta daqueles que só Al Berto soube transmitir no recanto da sua escassa obra. Dizia-me simplesmente isto:
Escuta de mansinho as portas brancas de tua antiga casa, lembra-te da tua face curiosa e do beijo roubado numa chuva rasgada pelo fugir de um táxi. Lembra-te de tuas pálpebras que beijei no silêncio enredando-te os dedos em fita de seda. Lembra-te... nunca te recordes... lembra-te apenas. A memória foi, é, será, unicamente minha...
E este simplesmente foi simplesmente simples. Junto vinha um envelope azul com o convite para mais um lançamento de um livro e foi aí que me revi numa festa, repleta de luzes, de feixes de luz agradáveis onde aperitivos e prazeres para o espírito e estômago não faltavam. Havia muita gente, de diferentes faixas etárias, de etnias diferentes e um burburinho sorridente, que os unia mastigando entre dentes, que todos eles haviam recebido juntamente com o convite um postal. A curiosidade enfeitava-os a todos porque de uma maneira ou de outra havia um segredo outrora partilhado a que o postal se referia.
No salão pareceu-me absurda a decoração com rosas vermelhas e orquídeas brancas um tanto ou quanto excessiva e roubando o respirável som de música árabe de fundo. De súbito ouviu-se a tua voz e a claridade encheu a sala de olhares a procurar-te ouviu-se a tua voz... essa tua voz... propunha um brinde à imortalidade do poema... razão sempre te achei um poema... sempre.. nisso não há que enganar... Mas a voz não era a tua... Não era naturalmente a tua.... vinha de um projector de imagem gigante que mandaras colocar na parede..
foto: James Balog

junho 12, 2006

The end


This is the end
Beautiful friend
This is the end
My only friend, the end

Of our elaborate plans, the end
Of everything that stands, the end
No safety or surprise, the end
I'll never look into your eyes...again

Can you picture what will be
So limitless and free
Desperately in need...of some...stranger's hand
In a...desperate land

Lost in a Roman...wilderness of pain
And all the children are insane
All the children are insane
Waiting for the summer rain, yeah

There's danger on the edge of town
Ride the King's highway, baby
Weird scenes inside the gold mine
Ride the highway west, baby

Ride the snake, ride the snake
To the lake, the ancient lake, baby
The snake is long, seven miles
Ride the snake...he's old, and his skin is cold

The west is the best
The west is the best
Get here, and we'll do the rest

The blue bus is callin' us
The blue bus is callin' us
Driver, where you taken' us

The killer awoke before dawn, he put his boots on
He took a face from the ancient gallery
And he walked on down the hall
He went into the room where his sister lived, and...then he
Paid a visit to his brother, and then he
He walked on down the hall, and
And he came to a door...and he looked inside
Father, yes son, I want to kill you
Mother...I want to...fuck you

C'mon baby, take a chance with us
C'mon baby, take a chance with us
C'mon baby, take a chance with us
And meet me at the back of the blue bus
Doin' a blue rock
On a blue bus
Doin' a blue rock
C'mon, yeah

Kill, kill, kill, kill, kill, kill

This is the end
Beautiful friend
This is the end
My only friend, the end

It hurts to set you free
But you'll never follow me
The end of laughter and soft lies
The end of nights we tried to die

This is the end

The Doors

junho 07, 2006

O regresso de João e Maria?

Outros sonhos

Sonhei que o fogo gelou
Sonhei que a neve fervia
Sonhei que ela corava
Quando me via
Sonhei que ao meio-dia
Havia intenso luar

E o povo se embevecia
Se empetecava João
Se emperiquitava Maria
Doentes do coração
Dançavam na enfermaria
E a beleza não fenecia

Belo e sereno era o som
Que lá no morro se ouvia
Eu sei que o sonho era bom
Porque ela sorria
Até quando chovia
Guris inertes no chão
Falavam de astronomia
E me jurava o diabo
Que Deus existia
De mão em mão o ladrão
Relógios distribuía
E a policía já não batia

De noite raiava o sol
Que todo mundo aplaudia
Maconha só se comprava
Na tabacaria
Drogas na drogaria
Um passarinho espanhol
Cantava esta melodia
E com sotaque esta letra
De sua autoria
Sonhei que o fogo gelou
Sonhei que a neve fervia
E por sonhar o impossível, ai
Sonhei que tu me querias

Soñé que el fuego heló
Soñé que la nieve ardía
Y por soñar lo imposible, ay, ay
Soñé que tú me querías
Chico Buarque

junho 06, 2006

Em Farol - Parte II (cont.)

Estava a ler um livro portador de um vírus de um amor irradiante, ancorado aos deuses e deixou-se adormecer de cabelo molhado envolta num turco rosa infiltrando por si mesma uma injecção de demência absoluta. Já tentara de todas as formas colorir o seu suicídio perfeito. Imaginara as diferentes formas de afugentar o mundo e conseguira isolar-se de tudo e todos num refúgio perfeito junto ao mar. Um apartamentozinnho medíocre mas que lhe dava o prazer de se sentir abandonada no meio das matas e pinheiros a circundarem-lhe o rastilho de si mesma. Viajara um pouco por todos os continentes e detivera-se na ilha mais completa que achou ser o farol condutor de uma mudança sincrónica sem o parecer da comunicação com pessoas vivas. Os mortos encarregavam-se de lhe trazer o correio, de lhe arrumar a casa e transformar deliciosas maravilhas de prazer culinário que raramente ingeria.
Um dia, mandou vir de propósito uma costureira exigindo um modelo sublime para tirar umas fotos, dizia, algo que fique fresco ao rubor do vento – e encomendou veludo roxo, ou talvez de um púrpura estranho, a verdade é que o vestido concebido pormenorizadamente recheado de detalhes semelhava-se a uma roupagem de uma cerimonia preciosa. Foi aí que chegaram os postais. Ela decorou-os um a um enchendo-os de memórias pessoais partilhadas com todas essas pessoas que de uma ou outra maneira perpassara com a sua vida interior e colorira com espaços alheios. Um desses postais chegou-me às mãos...

foto: Alexandre P.

junho 03, 2006

Estilhaço...

foto de M.Delgado e Silva

Não guardei o leite no frigorífico...
simplesmente bebi do teu mesmo copo
orgulhei-me de ser venerada nessa sombra
ácida de corpos carpindo
era feérica a carpete de veludo
a agitação das ondas nesse meu quarto
onde o céu não mais era que o verdadeiro
onde o céu não mais era através da cortina baça
crescias em mim
sempre o fizeras lentamente
crescias em mim...
algures voltámos atrás
algures
nem percebi bem quando, nem o quê
ou se porque...
algures
e o leite desaparecera
e a carpete
e o mar ascórbico
e o teu corpo...
Só a janela:
a velha janela feita de tela de universo
ainda lá está
fingindo-se janela,
caindo na filtragem da memória
decaindo...
deixando-se penetrar pelas eras e silvas
pelas heras e salvas da invasão-mater
vinda da natureza de fora...

junho 01, 2006

1 de Junho - o meu dia!!!!