abril 01, 2007

Partida II

foto: Alba Luna

A alma a derreter-se de cor nesta fuga
Na essência de nos darmos ao silêncio
De repercutir o sorriso
De escutar o esboçar de lábios
No bolso da algibeira
Debaixo da saia
Por baixo, não antes, mas por baixo
E deixar para trás a suplica
Deixá-la aclarar na vadiagem da luz..

março 26, 2007

Partida

foto: Lena Queiroz
Parto hoje pelas águas esguias até o sol deixar de me ver

Parto na madrugada devagarinho, encostada a ti, meu amor
Parto na sombra dessa cidade transformada em véu
Parto à porta da tempestade, roubada do meu pertencer
E sigo flutuante em minhas garras de lince
E sigo flamejante na fúria da neblina
Escondo-me do sol e dos pássaros terrenos
Respondendo ao mar em meu apelo
Recorrendo à chuva em mim deserto
Renego a tudo... a tudo... a tudo
Com a pouca força que me resta
Com a pouca treva a que me agarro
Com as mãos cansadas de dar
Ondeio-me penumbra-óssea neutra
Olvido-me de alma e ser quem sou
Ordem absoluta da negridão a chamar-me
Rainha a mim mesma
Regência magnífica
Raio incolor
Raiva...
Rancor...
Ruído...
Ervas daninhas a cultivarem meu corpo
Evas pecaminosas a escarnecer de meu corpo
Entes gulosas abominam-me a fé
Ratam minuciosamente a minha coloração
Repetidamente vejo ante mim a coroa no meu rosto
Rasgado e carcomido ante a bruma a assomar-me
a PERCORRER-me... a Percorrer-me...



março 20, 2007

Re(volta)

foto: Luis gonzaga Batista


Não nos temos a nós próprios em dádiva
Amortecemos a dor no silêncio de nossos olhos
A escutar, a atender, a soluçar o grito
Não nos temos em dádiva a vós próprios
Damos sempre mais e mais e mais ao invisível
E a soma anula-se à nossa frente
Não nos temos mais senão a nós próprios
A ferida aberta a fissurar o sorriso
A nós próprios não nos temos mais senão
A um passo da eternidade a esvair-se-nos de sentidos.

março 11, 2007

Cléo...

Foto: Cinzaxtulk

Sorri ao ver-te transformada em árvore...

março 03, 2007

Magnólias...

Foto: Suzana Costa

Somos a suavidade das luzes a entoar-nos no corpo
Uma epiderme demente na coroação da paz
Da tranquilidade
Do toque inacabado...
Exacerbadamente colorido pela dor de vida
Servimos no espaço névoo um banquete
Um banquete...
E nele o verdadeiro teatro sem máscaras
Pura semente em si mesmo.

fevereiro 28, 2007

Rasurai-me....

foto: José Lopes

Recado


ouve-me
que o dia te seja limpo e
a cada esquina de luz possas recolher
alimento suficiente para a tua morte

Al Berto (Horto de Incêndio 1996)

fevereiro 22, 2007

Mãos

Foto: Angelica
Dádiva é a entrega de dois corpos frente a frente despidos no seu interior...

fevereiro 14, 2007

Two

Foto: Catarina Mateus

As Lágrimas respiram em veludos de beijos secretos.

fevereiro 06, 2007

Além-nuvens...

foto: grENDel

Cada vez mais devagar
Cada vez mais indolor
Sou o pássaro que se esconde atrás do ponteiro
Que perdeu as asas sei lá onde
Não temo mais o voo
Não temo mais a súbita trepidação do abismo
Sei que estou nele
E cada vez esvoaço bem mais no fundo
Bem mais na inexactidão da confiança
E sobre nós assoma-se a passagem
A perturbação da fronteira ante nossos olhos
Temo-nos e que mais tem que nos importar?
A vida... A vida responde de dentro do bolso
A vida...
O relógio não pára...
A vida...
E bem depois dela
Estaremos de mãos dadas a ver o tempo passar?

janeiro 30, 2007

Mudez

foto: Angelica

Seguro meus lábios de encontro a meu peito...
Floresço-me devagar...
Sorrio-me devagar...
Não encontro os sonhos na pétala da tua boca...
Esqueço-me do mar
Escondo-me da vida
Frente a frente fujo-me

Limito-me a esperar de horizonte ao sol
Com a concha das flores agarrada à mão
E os olhos vidrados na nudez do sentimento

Calo-me...

janeiro 27, 2007

"Quem anda aí?...."

Foto: Superunknown

É um piko mau...
à tua espera
para te devorar...
Eh eh!

Arrogância

Foto: Karula

Despir-me da loucura inerente a mim...
Gritar atrás de um balcão de atendimento...


Anotem:
O Especial deixa de o ser quando esse alguém está convencido que o é...


Santa é a paciência de quem atura....

Acham-se todos tão especiais, tão importantes....
Nariz empinado
Silêncio no olhar de desprezo

(Acho que um dia danço mesmo atrás desse balcão)

janeiro 25, 2007

Esquizofrenia

Crazy

I remember when, I remember, I remember when I lost my mind

There was something so pleasant about that phase.
Even your emotions had an echo
In so much space

And when you're out there
Without care,
Yeah, I was out of touch
But it wasn't because I didn't know enough
I just knew too much

Is that make me crazy?
Is that make me crazy?
Is that make me crazy?
Probably

And I hope that you are having the time of your life
But think twice, that's my only advice
Come on now, who do you, who do you, who do you, who do you think you are?
Ha ha ha bless your soul
You really think you're in control

Well, I think you're crazy
I think you're crazy
I think you're crazy
Just like me

My heroes had the heart to lose their lives out on a limb
And all I remember is thinking, I want to be like them
Ever since I was little, ever since I was little it looked like fun
And it's no coincidence I've come
And I can die when I'm done

Maybe I'm crazy
Maybe you're crazy
Maybe we're crazy
Probably

Gnarls Barkley

janeiro 09, 2007

Sentada...

Foto: Miguel Delgado e Silva

Arrecadei as esperanças e deitei-me em meu túmulo. Não me lembro se antes , se depois de morrer... Só sei que a conversa não passava mais do que o sussurro das árvores a compactuarem um sorriso lesto comigo... assomava-se em minha direcção cada vez mais rápido cada vez mais mais e mais narcoticamente inevitável e insensível à coragem de minhas pernas que tremiam desnudadas na cadeira de seda... Era sonho? Cabisbaixei-me a ver se conhecia aquele chão. Sabia que lá fora havia luar. Havia uma luz prata a inundá-lo... Que conversa era essa... fugidia... enganadora... Trajava-se a noite de Primavera e eu não pude evitá-lo.... Sabia a sal e a pimenta esse fumo... essa corça enganadora a bater com seus passos pela floresta fora a alcançar-me... Inerte... fiquei inerte... as pernas tremiam cada vez mais... uma flor de pecado tocou-me e prendeu-se-me aos cabelos... mantive-me na cadeira... Julgamento de expulsão... crime almofada de tecto tumular, a dessa cadeira... deitei-me de mãos cruzadas no peito... deitei-me...? Acho que petrifiquei nos sete palmos... sentada...

janeiro 06, 2007

Babel....

A língua só passa a ser várias quando o ser humano se esquece que o é...

dezembro 18, 2006

Arcano

Foto: Carlos Afonso

Nem na poesia das coisas nos podemos situar...

dezembro 07, 2006

Desafio proposto por Pierrot

Foto: Rosalina Afonso
Vigias...
canso-me de guardar esta porta
de ter como companheira a cadeira
hirta,
aveludada outrora desse vermelho-princesas
canso-me por não ser mais que uma vara
da varanda ao meu lado..
Ouvindo cortesias de quem sai da porta principal
Lembro-me quando te sentavas a meu lado
na cadeira
eras não princesa mas a princesa que me cuidava
e quebraram-te de mim...
a cadeira enferrujou
a porta raramente é aberta
o varandim está a desfazer-se
e nem sequer tenho luz para navegar
nos teus olhos
por muito que aguarde...
não sei se espere mais
se ainda com o sol bem alto
me deixe dormir...

dezembro 03, 2006

Botão em flor

foto: Alba Luna

Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa. Não altera em nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro...

Clarice Lispector


dezembro 02, 2006

Olhar de A. sobre mim...

foto: Reynaldo Monteiro

Atrás desta janela
Não sabia
Simplesmente não sabia
Não sabia
Agarrada à dor
Agarrada à mudez
Não sabia
...
E tu...
E tu minha janela
Minha luz
Meu dia

novembro 29, 2006

Subversão

foto: Espírito da Luz
Onde se deita a luz
Onde o silêncio nos beija
Onde o vento murmura
Onde o tempo pára
Onde a voz me cega
Onde o ruído nos cruza
Ergo-me
Ergo-me em espiral
Revolta anti-oxigénio
Génio de mar
Mar revolto
Supra-sentidos soltos
Adamastora preeminente
Montanha-mel do onde
Onde...

novembro 18, 2006

A ti Mário...


7

Eu não sou eu nem sou o outro
Sou qualquer coisa de intermédio:

Pilar da ponte de tédio
Que vai de mim para o Outro.

Mário de Sá-Carneiro
(Lx, fev, 1914)

novembro 13, 2006

Passeio

Foto: Germeson H Dias

Damos os mesmos passos
de mar ausente
A areia grava-nos lado a lado
caleidoscópio granífero
Damos os pequenos passos
de mão presente
A líquida salgada a levitar-nos
em ondas ferozes
Damos...
de mente inversa
desavessando-nos
lentamente
suavemente
no correr de sedas
em lençóis de água
em bancos de areia
e o crepitar de folhas
(em nossos pés)
quase a queimar-nos
violentamente
no embaraço digital
de nossas pegadas...

novembro 05, 2006

Pecado...

foto: Angelica

Devagar meus lábios entregam a luz em teu peito
Devagar o sorriso coalha na textura do silêncio
E a esperança geme-me o hálito vivo
A saliva pecaminosa da lingua
A unha crivando meu traço de arlequim
E sigo vermelha a beirinha da luz de embalar
Quadrado após quadrado germinando a sede
Quadrado após quadrado teimando o segredo
a voz
o quente
o tecido de pele
o teor de sentidos
o tremer de minhas pernas
a veia vigorosa a penetrar-me
a incorporar-me
como que desenhando-me
como que gravando-me
as linhas
as marcas
os caminhos
onde me ando...

outubro 19, 2006

Boneca

Desenho: Shadow

O sol adormeceu no meu leito. Crescia a densa saudade de voltar a ser nuvem e esvoçar pelo ar ácido da chuva. Na rua perpassavam-se imagens de pessoas ausentes de sentimentos, dementes de sentimentos e ao fundo ouvia-se a luz de um piano. A correria silenciosa dessas janelas de carro molhadas pela chuva... via a calçada cintilar-se de dor numa criança semi-nua, pela sua inocência, levando uma boneca molhada pelo chão. A mãe caminhava erecta num tom franzino quase mecânico e arrastava-a em passos largos obrigando-a a esvoaçar pardaliticamente. Também ela desejava ser nuvem? Também ela se movia nesse esvoaçar... e terá alguma vez o sol adormecido no peito? A boneca molhada ao fundo da calçada. Uma perna a cada lado... as tranças cor-de-rosa a gemerem de água no nevoeiro nú da rua... Segui-a com os olhos estrada fora até a condensar num só ponto... o retrovisor mantinha-a distante e presente nos salpicos de chuva a espelharem pelos vidros...

outubro 18, 2006

to A.

Foto: Paulo Medeiros

É de sangue a lágrima que me corrói o peito.
Ácida... tão ácida...

É de sangue...
A lágrima...
Um sangue de felicidade corrosiva...

Obrigada pela luz da tua mão